O que você pensaria se ouvisse falar que pedras na vesícula de bois podem custar mais de R$ 1,3 milhão por quilo? Pois é, caso não acredite, saiba que esse ouro em forma de cálculo biliar bovino, de fato, existe, e hoje movimenta um ramo extremamente lucrativo da pecuária.
Valorizadas por sua utilização na medicina tradicional chinesa, essas pedras, que surgem na vesícula dos bovinos, chegam a ser negociadas em grandes cidades do país asiático a 230 dólares por grama (R$ 1,35 mil por grama, na cotação atual). Essa quantia é mais que o dobro da cotação atual do ouro, que está na faixa de 97 dólares por grama (R$ 571 por grama).
Com uma busca cada vez maior pela venda desses cálculos em razão do preço deles, o assunto tem gerado até mesmo repercussão internacional. Na última semana, o jornal americano The Wall Street Journal publicou uma reportagem sobre o mercado brasileiro de negociação de cálculos biliares bovinos.
Na matéria, o jornal conversou com José de Oliveira, presidente-executivo da Oxgall, empresa brasileira de comercialização de pedras de fel – como os cálculos também são conhecidos – sediada no estado de Goiás. De acordo com o empresário, a qualidade — e o preço — dos cálculos biliares variam muito, sendo as pedras castanhas consideradas as mais puras.
Ainda segundo o The Wall Street Journal, o envelhecimento da população chinesa, além do aumento da incidência de doenças como hipertensão e obesidade no país asiático, tem impulsionado a venda das pedras. A comercialização de ingredientes utilizados pela medicina tradicional chinesa, por sinal, já movimenta uma indústria de 60 bilhões de dólares (R$ 353 bilhões) anuais.
INFORMALIDADE E CRIMES
No Brasil, a atividade não é ilegal, mas opera em grande parte na informalidade. Recentemente, foram registrados episódios de assaltos a fazendas e frigoríficos, além de contrabando, com pedras escondidas em produtos variados para evitar fiscalizações, mesmo artifício que é usado rotineiramente por criminosos para o tráfico de drogas ilícitas, por exemplo.
Um episódio de furto dessas pedras foi registrado no último dia 16 de janeiro, quando o funcionário de um frigorífico foi preso suspeito de furtar a pedra da vesícula de um boi, em Inhumas, em Goiás. Segundo a Polícia Civil, a pedra furtada estava avaliada em R$ 13,5 mil.
No entanto, um dos casos de maior repercussão sobre o roubo de cálculos biliares bovinos aconteceu em setembro de 2023. Na ocasião, três homens renderam cinco funcionários de uma empresa de exportação de pedras de boi em Barretos (SP) e roubaram a carga avaliada em R$ 2 milhões.
PRODUÇÃO E EXTRAÇÃO DAS PEDRAS
De acordo com uma publicação acadêmica do Instituto Mineiro de Agropecuária e do Instituto Federal Goiano, a produção dos cálculos está relacionada à alimentação e é comum no rebanho criado em regiões com pastagem fértil em elementos alcalinos.
Outro fator determinante para a produção dos cálculos biliares é a idade dos animais. Segundo o estudo, as pedras são mais comumente encontradas em fêmeas que em machos. Isso ocorre pelo fato de os machos serem abatidos mais cedo, o que faz com que eles apresentem um número menor de cálculos.
Já a extração, de acordo com Mohanna Pagoto, auditora fiscal federal do Ministério da Agricultura, é feita a partir do corte da vesícula biliar do animal. Por segurança, porém, o trabalho é monitorado por câmeras. Segundo a auditora, o funcionário do frigorífico responsável pelo corte sequer tem acesso ao conteúdo do órgão, como forma de evitar possíveis furtos.
– No momento em que a vesícula é cortada, tem uma câmera filmando o funcionário. Toda a ação após o abate é filmada – detalha.
Depois do corte, o conteúdo da vesícula cai em uma tubulação, que leva o conteúdo até uma caixa fechada com cadeados.
– O conteúdo cai numa tubulação, o funcionário nem vê o que há dentro da vesícula. Tudo fica numa caixa fechada com cadeados, que é supervisionada por seguranças ao final do dia – completa.